sábado, 10 de maio de 2014

UMA RUGUINHA NO CANTO DA BOCA

Por conta das histórias que escrevo sobre relacionamentos, noite dessas, numa festa de aniversário de um amigo, a esposa de um dos convidados, deu um jeito, e me perguntou como eu reconhecia uma mulher que traía o marido.

Já que não esperava por tal inquietação, parei por um instante o que fazia, larguei o copo na bandeja do garçom e atirei: “ - uma ruguinha no canto da boca!” Ela, espantada, devolveu: “ - uma ruguinha?! Como pode uma simples ruguinha ser tão denunciadora?” tive que ir mais longe: “ - minha cara senhora! Claro que existem outras pistas deixadas por olhares, expressões no rosto, gestos, palavras, um certo enfado dormindo no corpo. Mas o recibo final sobre a existência de infidelidade por parte da mulher, ela assina de forma cabal e definitiva, com uma quase inexpressiva ruguinha no canto da boca, que passa despercebida para quem não é atento nesses íntimos segredos. Ah, mas não é uma ruguinha qualquer. É ela, de outra natureza, muito diferente das suas parentas, aquelas rugas de expressão.

Ela me olhou, sei lá se admirada ou surpresa e antes de voltar para junto das outras mulheres, me disse: “ - tenho medo de ti!” “ - Estou acostumado”, respondi. “ - Quer dizer então, que toda mulher que trai, tem uma ruguinha no canto da boca?”, insistiu. Dei de ombros e fiquei quieto.

Depois ficamos em grupos, bebendo e conversando. Resolvendo os problemas do mundo e falando futilidades, que é o que mais se fala nessas ocasiões. As mulheres também, logo ali falavam agitadas de filhos, maridos, profissões, academias de ginástica; das suas alegrias e aflições.

Vez por outra eu notava que a mulher aquela, olhava em minha direção, assim como quem está diante de uma perigosa cobra venenosa. Cheguei a pensar: “ - Senhor, me transformei numa ameaça para esta mulher!”

Voltei ao assunto da vez na roda que eu estava. E já impaciente eu olhava na direção que ela estava. E ela parecendo perturbada continuava me buscando, interrogativa, desconfiada. Mas havia um mistério se descortinando, um secreto entusiamo em toda a sua pessoa. Está bem, confesso: “ - ela realmente demonstrava um certo interesse. Precisava ir adiante.” Pronto! Falei o que não queria e o que muito menos devia ter falado.”

Não mais de uma hora após a primeira abordagem, ela voltou rápida para me perguntar: “ - não enxergaste nenhuma ruguinha no canto da minha boca?” Olhei para os seus olhos enigmáticos e falei: “ - só uma bem fininha, ainda recém-querendo se formar, bem no cantinho direito da boca.”

Antes de ir em direção ao toalete, ela me disse, safadinha: “ - bem que eu já estava notando. Mas vou fazer uma cirurgia plástica!”

“ - Não vai adiantar. A ruguinha volta no outro dia.”

“ - Será?”

“ - Então experimenta. Eu se fosse você, não botava dinheiro fora!”

Ela ficou coçando o canto direito da boca com a ponta do dedo indicador, toda indecisa.

Nisso se aproximou um sujeito, o marido, que quis saber sobre o que conversávamos. Ela pulou na frente e disse: “ - literatura meu bem. Estamos falando dos meus autores prediletos!”

Ele retornou para o seu grupo de amigos. E nela, a ruguinha ficou mais forte.

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